O paratleta sul-africano Oscar Pistorius foi condenado nesta sexta-feira por homicídio culposo – quando não há intenção de matar – de sua namorada, a modelo Reeva Steenkamp.
A juíza Thokozile Masipa disse que o atleta agiu de forma “negligente” ao disparar contra a porta do banheiro ao acreditar que sua casa estava sendo invadida.
A pena ainda não foi anunciada. Ele pode pegar até 15 anos de prisão, mas especialistas em direito dizem que ele deve ser condenado a algo entre sete e dez anos.
O paratleta, de 26 anos, foi condenado também por disparar sua arma por acidente em um restaurante, em um outro episódio.
Ao ouvir os veredictos, Pistorius sentou, esfregou o rosto e caiu ligeiramente para a frente, disse o correspondente da BBC Andrew Harding, que estava no tribunal.
Não houve grande reação, já que o veredicto era esperado, disse Harding.
Tanto a promotoria quanto a defesa podem apelar contra a decisão.
Pistorius já havia sido inocentado na quinta-feira da acusação de homicídio doloso.
Mais famoso atleta paraolímpico de sua geração, o corredor matou Reeva Steenkamp na madrugada de 14 de fevereiro de 2013. Ele alegou ter confundido Reeva com um suposto invasor em sua casa. Ela estava dentro do banheiro, e o paratleta disparou contra a porta.
Ao ler o veredicto, a juíza afirmou que “não se pode dizer que o acusado não teve uma crença verdadeira que havia um invasor”. Mas disse: “o acusado sabia que havia alguém atrás da porta do banheiro, e ele escolheu em usar uma arma”.
“Eu acredito que o acusado agiu precipitadamente e usou muita força. Está claro que sua conduta foi negligente”.
Se tivesse sido comprovada a intenção de assassinar Reeva, Pistorius poderia ter sido condenado à prisão perpétua, que na África do Sul leva a no mínimo 25 anos de reclusão antes de qualquer recurso por liberdade condicional.
Veja aqui seis momentos-chave do julgamento até a condenação de Pistorius.
1) Pedido de desculpa
Em sua primeira fala no tribunal, em 7 de abril do ano passado, Oscar Pistorius adotou um tom emocionado no discurso e começou pedindo desculpas à família de sua namorada pelo acontecido.
“Gostaria de aproveitar essa oportunidade para pedir desculpas aos pais de Reeva e à toda família Steenkamp, para aqueles que a conheciam e que estão aqui hoje…não houve um momento sequer desde que aquela tragédia aconteceu que eu não tenha pensado em toda a família dela”, disse.
“Todos os dias eu acordo pensando em vocês (família de Reeva) e rezando por vocês. Não consigo imaginar a dor e o vazio que eu causei em vocês. Mas eu só estava tentando proteger Reeva. Eu posso garantir a vocês que quando ela foi dormir naquela noite, ela se sentiu amada.”
Enquanto Pistorius falava, a mãe de Reeva permanecia calada, com expressão intacta.
2) Vômito e tormento
No dia 10 de março, uma foto da namorada de Pistorius morta foi mostrada no painel do tribunal sem nenhum aviso prévio. A imagem mostrava a cabeça de Reeva ensanguentada.
Ao vê-la, Pistorius imediatamente começou a vomitar em um balde ao lado dele seguidas vezes.
No mesmo dia, o patologista Gert Saayman descreveu os três tiros que Reeva levou naquela noite, um na cabeça, um na bacia e outro no braço. O tipo de munição da arma, segundo ele, era “desenhado para causar o máximo de estrago”.
Quase um mês depois, no dia 9 de abril, a promotoria apresentou um vídeo que mostrava Oscar Pistorius atirando em uma melancia e dizendo “não é tão macio quanto um cérebro…mas (essa munição) é suficiente para parar um zumbi”. Terminado o vídeo, o promotor Gerrie Nel perguntou ao atleta paralímpico: “Você viu o que aconteceu com a melancia? Explodiu. Foi isso que aconteceu com a cabeça de Reeva, teve o mesmo efeito com ela. Assuma a responsabilidade, Pistorius.”
Ele, então, mostrou no tribunal uma foto com cabeça ensanguentada de Reeva. Pistorius se recusou a olhar, desabou em lágrimas e disse: “Não vou ver essa foto para ficar atormentado. Quando eu peguei Reeva no banheiro, eu toquei a cabeça dela. Eu lembro. Eu estava lá, não preciso olhar para a foto.
Alguns vizinhos de Oscar Pistorius foram testemunhas no julgamento e relataram terem ouvido uma discussão entre o paratleta e a namorada.
Um capitão da polícia mencionou em seu depoimento uma mensagem de texto no celular enviada por Reeva a Pistorius algumas semanas antes do assassinato. “Às vezes eu tenho medo de você, de como você me agarra e como você reage comigo de vez em quando”, ela disse.
Pistorius, porém, ao final do interrogatório com ele, negou que tenha discutido com Reeva na noite da morte dela. O advogado de defesa do sul-africano pediu para o cliente ler o cartão de Dia dos Namorados (o “Valentine’s Day” na África do Sul é comemorado em 14 de fevereiro, madrugada do assassinato de Reeva) que a companheira tinha escrito para ele.
“Acho que hoje é um bom dia para dizer que eu te amo”, dizia.
O atleta paralímpico explicou que eles ainda não tinham trocado os presentes de Dia dos Namorados, mas contou que tinha comprado uma pulseira para Reeva e eles iriam buscá-la na joalheria no dia seguinte. Ele reiterou que os dois não haviam brigado naquela noite.
Duas testemunhas da promotoria contaram um episódio em que viram Oscar Pistorius atirar com seu revólver demonstrando bastante raiva depois de ter sido parado por um policial.
A ex-namorada dele, Samantha Taylor, disse que o paratleta andava com uma arma o tempo inteiro. Ela relatou que um policial parou o carro em que estavam ela, Pistorius e um amigo por estarem em alta velocidade. O policial chegou a repreender Pistorius por deixar a arma sem proteção largada no banco do carro. Eles acabaram liberados e, pouco tempo depois, o atleta paralímpico atirou para cima pelo teto solar do carro enquanto ria bastante.
Darren Fresco, que estava dirigindo o carro naquele dia, deu um depoimento parecido sobre o incidente e chamou Pistorius de um “apaixonado por armas”.
A defesa do réu, porém, disse que “as duas testemunhas não era confiáveis”. Pistorius, por sua vez, declarou-se inocente de todas as acusações que enfrentou – duas envolvendo tiro de arma de fogo em público, uma de posse ilegal de munição, e agora a de homicídio.
5) Teste psiquiátrico
No dia 11 de maio, um psicólogo convocado pela defesa, Merryll Vorster, disse no tribunal que Oscar Pistorius sofria de um distúrbio generalizado de ansiedade desde a infância – mencionando a amputação de suas pernas quando tinha 11 meses de idade, o divórcio de seus pais quando ele tinha seis anos e a morte da sua mãe quando tinha 15.
A promotoria, então, fez um pedido para que ele ficasse sob observação médica por um período, e o juiz decidiu que ele passaria por um mês de avaliação. Um grupo de quatro médicos fez o acompanhamento e concluiu que Pistorius não sofria de qualquer distúrbio mental e que tinha plena consciência para distinguir entre o certo e o errado.
6) Mentiras em ‘bola de neve’
No dia 7 de agosto, o promotor Gerrie Nel fez sua argumentação final acusando Oscar Pistorius de ter sido uma “testemunha mentirosa” que havia contado no tribunal “mentiras em bola de neve”. Ele listou algumas das “inconsistências” do depoimento do paratleta, que foram contestadas pela defesa no dia seguinte.
O promotor disse que Pistorius utilizou três estratégias para se defender com versões distintas – que ele atirou na namorada por engano, em um estado de pânico, ou em legítima defesa contra um assaltante – e concluiu: “Essas versões nunca poderão existir ao mesmo tempo”.
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