- Author, Liana Aguiar
- Role, De Barcelona para a BBC Brasil
No mesmo dia em que os escoceses rejeitaram em um plebiscito a possibilidade de se tornarem independentes do Reino Unido, o Parlamento da Catalunha (região no nordeste da Espanha) aprovou nesta sexta-feira uma lei que permitirá ao governo local convocar uma votação semelhante à revelia de Madri.
A lei, defendida pelo líder do governo catalão, Artur Mas, foi aprovada por 106 votos a favor e 28 contra. A expectativa é de que o plebiscito de independência seja realizado em novembro deste ano.
O governo espanhol, no entanto, considera a consulta ilegal e afirmou que vai recorrer da decisão ao Tribunal Constitucional da Espanha (equivalente ao STF no Brasil).
Artur Mas convocou uma entrevista coletiva especificamente para avaliar o processo escocês. Ele parabenizou “o povo britânico por essa grande lição de democracia que deu ao mundo”.
“Obrigado, Escócia, por ensinar que votar é o único caminho para resolver democraticamente as aspirações de um povo”, disse.
Entretando, ele advertiu que o resultado da votação escocesa não é um revés para o processo catalão de independência: “Se alguém tinha a ilusão de que o ‘Não’ na Escócia poderia fazer sombra ao processo catalão, estava enganado.”
‘Lição de democracia’
A vitória do “Não” no plebiscito de independência da Escócia teve forte ressonância no debate separatista da Catalunha. Logo após a divulgação oficial, instituições do poder Executivo e Legislativo, mídia e sociedade civil da região autônoma espanhola se posicionaram sobre a votação.
Também logo após o resultado do plebiscito na Escócia, o primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, divulgou um vídeo em que parabenizou os cidadãos do país por ter decidido “de maneira clara e inequívoca, continuar formando parte do Reino Unido e, por extensão, da União Europeia”.
A vitória do “Não”, disse o premiê espanhol, “evitou as graves consequências econômicas, sociais, institucionais e políticas que a separação do Reino Unido e da Europa poderia ter causado”.
Rajoy elogiou que o plebiscito foi feito de “forma massiva, pacífica e com escrupuloso respeito à legalidade de seu país”.
Embora não tenha se dirigido diretamente ao governo catalão, ele se referia ao principal argumento do governo central da Espanha para tentar parar o processo separatista da Catalunha, a inconstitucionalidade da consulta.
Artur Mas reiterou que o processo catalão está fundamentado, sobretudo, em um “fato democrático”, que é o direito de votar. “Na Catalunha, continuamos e vamos adiante, reforçados por essa lição de democracia do Reino Unido, que deixou votar”, disse Mas.
Dirigindo-se às instituições do Estado espanhol, o líder catalão afirmou que a lição do processo no Reino Unido e Escócia é que “votar não divide, votar une”, pois houve quase 85% de participação dos eleitores. “O que separa é não poder votar.”
Ele lembrou ainda que o “não” também pode ganhar no processo catalão, mas que “é preciso saber jogar e ganhar democraticamente”.
O líder catalão reforçou que pretende realizar o referendo dentro da legalidade. “Como os escoceses, nós queremos fazer a consulta de acordo com o Estado espanhol”, disse.
Manifestações
Em 11 de setembro passado, no Dia Nacional da Catalunha, cerca de 1,8 milhão de pessoas participaram de uma manifestação em Barcelona, em que reivindicaram o direito a votar.
A Assembleia Nacional Catalã (ANC), uma das organizadoras do evento, elogiou nesta sexta-feira “a oportunidade que o povo escocês teve de decidir, com liberdade através das urnas, seu futuro coletivo”. Para a ANC, votar já representa uma vitória democrática.
A ANC ponderou que o resultado escocês não interfere no processo da Catalunha.
“Londres defendeu a união à base de urnas e sedução (dos escoceses), enquanto o governo da Espanha nega a democracia aos catalães e opta por uma política de recentralização feroz”, informou uma fonte da ANC.
Além disso, “nem a base social mobilizada a favor do processo nem o nível de descontentamento da Escócia com Londres se parecem ao que quantificam a maioria parlamentar, as diferentes pesquisas e as concentrações massivas da sociedade civil catalã”, compara.
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