- Author, Jonathan Marcus
- Role, Analista de Defesa da BBC
O secretário de Estado Americano John Kerry completou uma visita por países do Oriente Médio tentando juntar aliados para enfrentar o EI (Estado Islâmico).
Durante a ação diplomática, ele conseguiu o apoio de dez países árabes, incluindo a Arábia Saudita e o Catar.
Alguns países até se comprometeram a participar de ataques aéreos – desde que aprovados pelo governo do Iraque – e até o envio de tropas terrestres, o que por enquanto não faz parte dos planos americanos.
Enquanto a comunidade internacional se articula para atender à demanda da Casa Branca, o analista de Defesa da BBC, Jonathan Marcus examina como essa coalisão está sendo formada e quais as chances que tem de atingir seus objetivos.
Por que os EUA estão adotando uma posição dura contra o Estado Islâmico?
A escala e o escopo do EI o destacam de outros grupos jihadistas até agora. A organização controla grandes parcelas de um território que abrange a Síria e o Iraque, já capturou grandes quantidades de armamento e tem consideráveis recursos financeiros.
Isso tudo faz o EI mais semelhante a um “quase-Estado” do que a um grupo terrorista organizado em células. Sua ambição de criar um califado islâmico e de se expandir ainda mais faz dele uma ameaça aos aliados dos americanos na região. A presença de combatentes estrangeiros entre suas patentes mais altas também levanta a hipótese de atentados contra o Ocidente.
Que tipo de apoio John Kerry conseguiu obter?
Os Estados Unidos obtiveram um forte apoio, ao menos no papel, de países pró-Ocidente na região.
Entre as medidas requeridas dos Estados não há apenas ações militares. Também devem ser colocados em prática o controle de fronteiras, repressão o financiamento do EI, além de esforços contra a propaganda ideológica para impedir que mais estrangeiros se juntem ao grupo.
Alguns aliados de Washington já estão elevando o tom, entre elas a Austrália, que anunciou o envio de uma equipe de 600 especialistas inicialmente para os Emirados Árabes. O grupo incluiria combatentes de forças especiais para treinar militares iraquianos e curdos, além de seis caças F-18 Super Hornet e outras aeronaves de apoio.
A França também parece estar disposta a se envolver militarmente.
Um alto general americano – John Allen – foi apontado para coordenar o que parece ser uma extensa coalizão que pode persistir por um tempo considerável.
Os países da região podem cumprir a tarefa sozinhos?
Eles simplesmente não têm as habilidade e capacidades necessárias. Mesmo as tropas iraquianas treinadas e equipadas pelos Estados Unidos não resistiram ao ataque do EI. Contudo, elas estavam enfraquecidas por problemas de corrupção e favoritismo surgidos durante o governo do premiê Nouri Maliki.
Os Estados Unidos e seus aliados ocidentais não devem usar suas tropas terrestres, mas tomarão as medidas necessárias para que as tropas locais recebam o apoio aéreo necessário para ter sucesso.
Na Síria, onde a situação é mais complexa e não deve haver uma força terrestre apoiada pelo Ocidente e pelos países árabes, os bombardeios americanos devem ser guiados por informações de inteligência – com o objetivo de enfraquecer lideranças e destruir instalações do EI.
A Grã-Bretanha participará dos ataques?
Apesar dos sinais de que os britânicos se juntarão à coalizão, ainda não está claro quando o anúncio de participação militar ocorrerá e se ela se restringirá apenas ao Iraque ou se ocorrerá também na Síria.
A Grã-Bretanha já participou do resgate de membros da comunidade Yazidi e pode acionar rapidamente caças Tornado, uma avião de coleta de dados de inteligência e helicópteros Chinook.
Mas o premiê David Cameron tem que lidar com fatores domésticos. Pode haver resistência no Parlamento e o referendo na Escócia pode atrasar eventuais decisões. Isso porque o governo teme que mais eleitores votem pela independência para não se envolver no que entendem por guerras da Grã-Bretanha.
Mas por outro lado o assassinato de um cidadão britânico pelo EI pode compelir Cameron a agir.
Se os EUA são tão poderosos, por que precisam de aliados?
Por razões políticas e práticas. Os Estados Unidos deixaram um legado amargo na região devido aos erros da campanha militar que derrubou Saddam Hussein.
Além disso, os aliados árabes de Obama acreditam que ele tem vacilado em agir decisivamente.
Assim, criar uma coalizão ampla é importante no Oriente Médio – para convencer a população local que essa não será mais uma reedição da Guerra do Iraque. E também para o público interno dos Estados Unidos, que deve ser persuadido de que tropas terrestres americanas não entrarão em combate, uma vez que essa tarefa será de aliados regionais.
A guerra pode ser travada sem o Irã e a Síria?
O Irã é um fator vital e seu apoio é essencial para que o governo de Bagdá resista aos assaltos do EI.
Mas os Estados Unidos insistem que não pode haver uma relação explícita com Teerã – apesar de conversações estarem acontecendo à margem dos grandes encontros internacionais.
Outro problema é que apesar dos interesses americanos, iranianos e árabes convergirem em relação ao Iraque, isso não acontece na Síria. O Irã é um dos poucos países que ainda apóiam o regime de Bashar Assad.
Apesar do governo sírio também estar lutando contra o EI, a coalizão não vai querer ter laços explícitos com Damasco.
Esse é um caso em que o inimigo do meu inimigo não é meu amigo.
Então, enquanto a situação na Síria não for resolvida, o país continuará como um refúgio para as forças do EI.
Qual a diferença dessa coalizão em relação às anteriores?
Todas as coalizões tendem a ser similares até um certo ponto e, ao mesmo tempo, serem diferentes das formadas em crises anteriores.
Em 1991 uma coalizão de cerca de 30 países foi formada para tirar forças iraquianas do Kuwait.
Ela incluiu potências como França e Grã-Bretanha e Estados árabes como Arábia Saudita, Egito e até Síria.
A diferença é que tratava-se de uma campanha militar curta, com um objetivo claro e tangível.
Já desde 11 de Setembro o esforço amplo contra a al Qaeda envolveu uma grande quantidade de países em operações de paz no Afeganistão.
Mas as ações eram menos formais e as ameaças diferenciadas e difusas – com ramos do grupo extremista operando no Iraque, Iêmen e na África.
A campanha também envolveu ataques de drones americanos e atividades conduzidas por forças militares locais.
Além disso a ação reuniu elementos de contra insurgência e contraterrorismo.
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